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“Um homem não morre quando deixa de existir e sim quando deixa de sonhar”.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Juiza fala em desmoralização da Justiça

A emblemática novela em que se transformou o julgamento do mérito do pedido de cassação do diploma e do mandato do prefeito Duciomar Costa e de seu vice, Anivaldo Vale, provocou nesta quinta-feira (1º), durante sessão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), um desabafo da juíza Ezilda Pastana Mutran, revisora do caso.
Indignada com novo pedido de vista do processo, desta vez do juiz Rubens Leão - o que fez novamente retardar o julgamento do caso, agora jogando-o para fevereiro de 2012 -, ela foi contundente: “o meu posicionamento já está pronto e o meu voto também está pronto. Respeito o posicionamento dos colegas, porque ninguém é perfeito. Eu só lamento, excelência, que isso vá se prorrogando, prorrogando. Muita gente está esperando por um pronunciamento nosso, mas infelizmente temos que acatar (pedido de vista). A Justiça vai ficando a desejar. Lamento muito que a Justiça vá ficar, eu vejo assim, com uma desmoralização, como se tivéssemos medo de tomar uma decisão”.
Ezilda Mutran também lamentou que só para o ano o processo voltará a ser julgado. Enquanto isso, segundo ela, o mandato do prefeito vai terminando. E disparou: “as pessoas vão tirando proveito de todas as infrações. As leis não vão sendo respeitadas e que a coisa toda acabe em pizza. Eu lamento”. O presidente do TRE, desembargador Ricardo Nunes, ouvido pelo DIÁRIO, afirmou que há muito tempo, em várias sessões da corte, vem alertando os juízes para que julguem os prefeitos que estão na mesma situação de Costa e Vale.
“Nós já fizemos quatro eleições suplementares neste ano, mas esse caso (do prefeito de Belém) foi ficando, ficando, ficando”, criticou. Sobre as declarações de Ezilda Mutran, ele disse que não tirava as razões da juíza ao cobrar uma definição para o processo. “Ela tem o direito de dizer o que pensa. Eu apenas lamento que o processo ainda esteja nessa situação. E não foi por falta de aviso da minha parte”, enfatizou Nunes. O desembargador informou que suas cobranças estão registradas nas atas das sessões que ele presidiu.
De acordo com a justificativa apresentada por Leão, a questão que envolve o recurso contra a expedição do diploma de Costa e Vale é complexa e precisa ser melhor analisada.
Para ele, o abuso de autoridade supostamente praticado pelo prefeito e que ensejou voto contundente do juiz André Bassalo, “não pode ser explorado em recurso contra a expedição de diploma. O mesmo ocorreria no caso da conduta vedada ao agente público em campanha eleitoral. “A conduta vedada exauriu seus efeitos na própria representação”, disse o juiz. Por conta de seu entendimento, o prefeito também não teria praticado abuso de poder econômico, assinalando que as placas foram afixadas pela cidade com obras e serviços dentro do período autorizado pela lei.
À certa altura, Leão observou ter lido no processo que 450 placas haviam sido fotografadas e anexadas nos autos. O juiz fez suas contas, revelando que apenas uma placa tinha sido contada repetidamente por seis vezes. André Bassalo, em aparte, contestou Leão, esclarecendo que não estavam em julgamento as propagandas, as condutas abusivas ou conduta vedada, mas o “abuso da propaganda”.
Depois de enfatizar que as provas contidas nos autos dos crimes eleitorais do prefeito eram suficientes para a cassação do mandato, Bassalo afirmou que o que aconteceu em Belém, na eleição municipal de 2008, foi a “violação do Estado de Direito”.
O voto de Bassalo pela cassação do prefeito e do vice, fundamentado e com citações de acórdãos de casos semelhantes em que estavam configurados crimes eleitorais, abuso de poder econômico e de propaganda, além de promoção pessoal de candidatos com recursos públicos, empatava a disputa em 1 a 1. É que na terça-feira, o juiz Antonio Carlos Campelo, relator do processo, manifestou-se favorável ao improvimento do recurso para que Costa seja mantido na prefeitura. Com o pedido de vista de Leão, ainda faltam os votos dos juízes Vera Araújo, Ezilda Pastana, do desembargador Leonardo Tavares, que se licenciou por quatro dias porque precisou fazer uma “viagem de serviço”, além do próprio Leão.
O desembargador Raimundo Holanda Reis, que substituiu Tavares, se absteve de emitir opinião ou de votar, alegando não conhecer o processo. Ele poderia ter pedido vista dos autos, mas preferiu se utilizar da prerrogativa de não participar do julgamento.
Afirmações “gravíssimas e reveladoras”
Segundo colocado na eleição de 2008, o hoje deputado federal José Priante (PMDB) manifestou “perplexidade” com as declarações da juíza Ezilda Mutran. “Fiquei tocado pela declaração dela de que muita gente está se aproveitando desse processo e que o caso pode acabar em pizza”. Priante disse que as afirmações são “gravíssimas e reveladoras” e que oportunamente irá se manifestar sobre mais um adiamento do julgamento de Duciomar pelo TRE.
O deputado entende que seu direito nesse processo está sendo subtraído pelo tempo. “Quando a Justiça não julga, o mandato vai acabando e o prazo fica eterno. Até agora não tive nem o direito de ver o meu direito ser julgado”, resumiu Priante.
O advogado Inocêncio Mártires Coelho Júnior explicou que o retardamento no desfecho de uma ação eleitoral, especialmente quando envolve o exercício de mandato eletivo, projeta “inegável dano irreparável”.
A lei das eleições fixa o prazo máximo de um ano para que uma causa seja julgada pelo Poder Judiciário Eleitoral, em todas as instâncias e isso não vem sendo observado. Inocêncio declarou ser testemunha do empenho do presidente Ricardo Nunes em acelerar os julgamentos dessas causas, porém, acredita que isso não tem sido suficiente.
Ele defende que seja encontrado um método mais eficaz para neutralizar essa inércia e imprimir maior eficácia na prestação da jurisdição. Para o advogado, o valor do tempo no processo eleitoral é valioso. O mandato eletivo tem prazo certo. Quanto mais se retarda um veredicto fica a sensação de que “violar a lei eleitoral compensa”. A corajosa advertência da juíza Ezilda Mutran, diz Inocêncio, é pertinente e merece profunda reflexão.
(Diário do Pará)

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